sábado, 28 de maio de 2011

mais um outono...

Nestas manhãs de outono, cinzas manhãs de outono, caminhar por estas ruas traz lembranças doces e tristes.
A inocência de outrora ainda está guardada nas tatuagens feitas nas árvores. Registros de dias felizes, onde as nossas manhãs eram tão cinzas quanto estas, mas tínhamos cores dentro de nós.

E coloríamos com sorrisos as ruas e os passantes, que riam-se também de nossos risos. Nossas vozes cantavam as alegrias dessa cidade, que hoje parece morta. E o nosso canto falava de sonhos, falava do impossível. Cantávamos uma vida surreal, que só existia longe, distante... tão distante que jamais pudemos alcançá-la.

O chão de areia era tão frio quanto hoje, mas nos aquecíamos em nossos jogos de faz-de-conta. O mar sussurrava impropérios mais amenos, aos quais nem dávamos atenção, e o vento, que criava formas arquitetônicas nos teus cabelos, hoje parece soprar em uma só direção: a direção que afasta aqueles dias felizes cada vez mais para o passado...

Olhar este céu castanho me faz lembrar os teus olhos. Vejo a tempestade se formando e relembro aquele último instante. Ao que a chuva cai, as lembranças se encharcam e pesam dentro de mim. As lágrimas que eu chorei nas tuas mãos caem agora sobre o teu rosto, num retrato em sépia. E sinto-me vazia de qualquer emoção. Sinto-me vazia de você.

Dias felizes, dias tristes... dias passados.

O tempo coloca outros dias sobre aqueles nossos dias. Enterra-os sob tantos dias que se passaram desde então. E a cada novo dia, enterra profundamente um dia sob o outro, mas as lembranças não se destroem. E mesmo que os dias de hoje, os novos dias, estejam na superfície das nossas vidas, a tatuagem das árvores não se desfaz.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Senseless / Insane

Não faz sentido essa lágrima
Uma mancha sobre o sorriso
Não faz sentido essa dor
Coroando estes sentimentos.

O Oceano faz ainda menos sentido...
E as chagas que ele faz abrir 
Sobre toda essa beleza,
Não fazem sentido nenhum.

Há muito desafiei o tempo
Num jogo simples e sem sentido,
Onde eu ditei as regras
E marquei todas as cartas.
Agora que estou ganhando
Vacilo...
Entre a tristeza e o riso,
Estou me contorcendo
Dentro de uma coreografia
Insana.

Passos contados, estagnados.
A minha dança cessou
Mas o tempo segue,
Em todos os sentidos.

O tempo faz chorar o vento
Nas frestas entreabertas
Das minhas janelas.
E o vento faz bater todas as portas
Com um barulho ensurdecedor,
Contra mim, a meu favor,
E já não sei qual delas abrir...
Já não sei se quero sair...
Se há tempo ou se não há.

Deixei de escolher as portas.
Deixei de escolher as escolhas.
Deixei de fazer poesia
E meu caderno, sobre a cama,
Amarelou-se,
Porque deixei o tempo passar...

Agora o riso é insano...
Assim como a lágrima,
Assim como as dores,
Assim como o Oceano
E todas as suas chagas...
Assim como nós:
Nossos dramas e nossa beleza.

Até nossa pureza é insana.
Assim como todas as coisas.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Tarde

Eu não tenho identidade.
Deixei de ser eu pra ser tua.
E não fosse a nudez dessa verdade
capaz de descobrir
além dos meus seios,
também aquele meu eu que nem eu
sei bem onde habita,
eu esconderia o que sinto
no fundo da alma
onde o coração palpita.

Eu não tenho identidade.
Sou muda, cega, não ouço.
Meu caminhar segue teus passos,
meus pensamentos, a tua voz.
E eu respiro, apenas...
O ar que você me sopra.

Distante dos braços que amo,
metade.
Envolta por eles,
una.